sábado, 4 de agosto de 2012

A equação de onda

A equação de onda é uma equação diferencial parcial de segunda ordem e linear cuja importância em física é amplamente conhecida. Historicamente, foi primeiramente escrita por D'Alembert aquando das suas investigações sobre o problema das cordas vibrantes mas encontra aplicações na descrição de fenómenos de propagação em campos como acústica, óptica e dinâmica dos fluidos. O problema das cordas vibrantes foi também estudado por Euler, Daniel Bernoulli e Lagrange, estando na base de uma das mais interessantes disputas, a meu ver, na história da matemática. Na contenda estavam em jogo dois conceitos que viriam a ser cruciais no desenvolvimento da análise do século seguinte: a noção de função e continuidade de uma função, e as séries trigonométricas. No que se segue pretendo apenas apresentar o método que conduziu D'Alembert à sua solução.
Supunhamos que submetemos uma corda que se encontra esticada entre as suas duas extremidades a um pequeno deslocamento. Se a soltarmos, verificamos que esta irá entrar em vibração motivada pelas forças elásticas que tendem a contrariar essa perturbação. Assumindo que escolhemos um referencial rectangular de tal modo que a corda se encontre esticada ao longo do eixo das abcissas, então representaremos por \(y(x,t)\) a ordenada do ponto da corda com abcissa \(x\) no instante \(t\). A equação fica da forma

\[\frac{\partial^2 y}{\partial t^2}-c^2\frac{\partial^2 y}{\partial x^2}=0\]
Para a resolvermos, começamos por notar que \(dy=pdx+qdy\) onde \(p=\frac{\partial y}{\partial x}\)  e \(q=\frac{\partial y}{\partial t}\). Admintindo que \(y\) é uma função com todas as derivadas de segunda ordem contínuas temos
\[\frac{\partial p}{\partial t} = \frac{\partial q}{\partial x}\]
 Com base nestas novas variáveis escrevemos a equação de onda como
\[\frac{\partial q}{\partial t} = c^2 \frac{\partial p}{\partial x}\]
Escrevemos os diferenciais de cada uma das novas funções introduzidas como
\[\left\lbrace\begin{matrix} dp & = & \frac{\partial p}{\partial x}dx + \frac{\partial p}{\partial y}dy\\ dq & = & \frac{\partial q}{\partial x}dx + \frac{\partial q}{\partial y}dy \end{matrix}\right.
\]
Combinando o sistema de equações anterior com a equação de onda e a igualdade entre as derivadas cruzadas em p e q, obtemos
\[\left\lbrace\begin{matrix} d(cp) & = & \frac{\partial (cp)}{\partial x}dx + \frac{\partial p}{\partial t}d(ct)\\ dq & = & \frac{\partial p}{\partial t}dx + \frac{\partial (cp)}{\partial x}d(ct) \end{matrix}\right.\]
Somamos e subtraímos cada uma das equações anteriores para ficarmos com
\[\left\lbrace\begin{matrix} d(cp+q) & = & \left\lbrack\frac{\partial (cp)}{\partial x} + \frac{\partial p}{\partial t}\right\rbrack d(x+ct)\\ d(cp-q) & = & \left\lbrack\frac{\partial p}{\partial t} - \frac{\partial (cp)}{\partial x}\right\rbrack d(x-ct) \end{matrix}\right.\]
Segue-se daqui que \(cp+q=f_1(x+ct)\) e \(cp-q=f_2(x-ct)\), de onde vem
\[\left\{\begin{matrix} cp & = & f_1(x+ct) + f_2(x-ct)\\ d(cp-q) & = & f_1(x+ct) + f_2(x-ct) \end{matrix}\right.\]
Porém, lembrando que \(dy=pdx+qdt\), vem
\[d(cy)=f_1(x+ct)d(x+ct)+f_2(x-ct)d(x-ct)\]
Fazemos a mudança óbvia de coordenadas
\[\left\{\begin{matrix} u & = & x + ct\\ v & = & x - ct \end{matrix}\right.\]
cujo determinante do jacobiano vale \(-2c\) e é diferente de zero caso \(c\) também o seja. Reduzimos a equação de onda à forma \(d(cy)=f_1(u)du+f_2(v)dv\). Como também
\[\frac{\partial f_1}{\partial v}=0=\frac{\partial f_2}{\partial u}\]
estamos portanto na presença de um diferencial total \(d(cy)\). Os métodos habituais de integração permite-nos facilmente concluir que
\[y(x,t)=F_1(x+ct)+F_2(x-ct)\]
Vemos que a solução geral da equação de onda se pode considerar como a sobreposição de duas ondas que se movem em sentidos opostos. O método aqui apresentado para obter a solução, excluindo a aplicação da notação mais moderna, aproxima-se bem daquele que foi utilizado originalmente.

quarta-feira, 1 de agosto de 2012

A lei do inverso do quadrado - uma contenda

Uma das mais famosas contendas científicas opôs Hooke a Newton pela primasia na descoberta da lei do inverso do quadrado da distância que descreve a atracção gravítica entre todos os corpos com massa. Convém salientar que este último autor esteve ainda envolvido numa disputa com Leibnitz pela descoberta do cálculo infinitesimal.
A destruição ou desaparecimento dos artigos privados de Hooke dificulta a avaliação da influência de um autor sobre o outro. Contudo, uma vez que os Principia são deveras conhecidos, apresento aqui os três princípios lançados por Hooke no seu texto Uma tentativa para provar o movimento da Terra por intermédio de observações" de 1674 sobre os quais o cientista promete construir a sua teoria de um Sistema do Mundo.

Primeiro, todos os Corpos Celestes, não importa as suas naturezas, possuem uma atracção ou força gravítica na direcção dos seus próprios centros, pelo que atraem não apenas as suas partes e as impedem de se separar, como observamos ser o caso da Terra, mas também atraem todos os Corpos Celestes que se encontram nas suas esferas de actividade; e consequentemente não só o Sol e a Lua têm influência no corpo e movimento da Terra, e a Terra neles, mas também Mercúrio, Vénus, Marte, Júpiter e Saturno, pelas suas forças atractivas, têm influência considerável sobre o seu movimento do mesmo modo que a força atractiva da Terra também possui uma influência considerável sobre cada um dos seus movimentos.

A segunda suposição é esta, que todos os corpos não importa quais que são colocados num movimento directo e simples continuarão a mover-se em linha recta até que sejam deflectidos por quaisquer forças efectivas e o seu movimento seja dobrado de modo a descrever um círculo, uma elipse ou outra curva mais complicada qualquer.

A terceira suposição é, que estas forças atractivas são mais intensas quanto mais próximo o corpo esteja dos seus centros. Ora, o que são estes vários graus, ainda não verifiquei experimentalmente; mas é uma noção, que se for devidamente seguida como deve ser, irá assistir o Astronómo de uma maneira eficaz na redução de todos os Movimentos Celestiais a uma certa regra, que duvido ser possível sem esta. Aquele que entender a natureza do Pêndulo Circular e do Movimento Circular, facilmente compreende toda a extensão deste Princípio, e saberá encontrar direcção na Natureza para o verdadeiro enunciado.